DANDARA DOS PALMARES
Cena 1
Um preto velho em cena:
Pouco se sabe da história de uma mulher que existiu...
Existiu
Resistiu
E desapareceu no abismo
Preferindo o vazio
Do que o julgo frio
Daqueles que pensam em escravizar
Seu Nome?
Dandara dos Palmares
Líder negra
Mulher de Zumbi
Heroína sim da Pátria
Apagam se as luzes e uma silhueta de mulher
A voz da mulher diz
Serra da Barriga
A altura da resistência
Buscando liberdade
E dizendo não
Ao tormento da escravidão
1694 o ano em que a força se fez
Onde a vida com altivez
Se jogou da Pedreira
Indo ao Paraíso
Para não voltar à Escravidão
O que é escravizar ]?
É subjulgar
E a escravidão de agora?
Aflora
Em sentido do egoísmo
E na força do negacionismo
Quem diz não contra a escravidão
Está realizando nobre ação
De refutar qualquer tipo de desamor
A luta é por amor
Repartido e construído
Na certeza da paz
Viva Dandara mulher guerreira
Que com altivez
Lutou pela liberdade
Cena 2
( Um grupo de guerreiros)
Chico Zambi – Vão invadir o Quilombo - Temos que fazer alguma coisa
Entra Dandara que começa uma GINGA DE CAPOEIRA
Sou Maria Felipa, Sou Luiza Main Sou Marielle, Sou Tia Ciata, sou você, sou
todos aqueles que dizem não ao racismo
Apagaremos com força e alegria os rastos do racismo
Não à escravidão
Não ao egoísmo
Não à discriminação racial
Não ao racismo estrutural
Não ao sentido podre do poder
Não ao enbraqueamento da população brasileira
Palmares tem vida
Tem policultura
Tem cuidados com a agricultura
Temos madeira e cerâmica
Temos milho, mandioca, feijão, batata doce, cana de açúcar e
banana.
Temos óleo da pindoba
Temos liberdade
E tudo aqui é coletivo.
Cena 3
Entra GANGA ZUMBA
Bonecos articulados de ZUMBI, GANGA ZUMBA E DANDARA
Ganga Zumba – Acabei de fazer um acordo com o governo.
Zumbi – Como assim?
Ganga Zumba – Veja o que teremos que fazer
autoridades libertassem palmarinos que haviam sido feito
prisioneiros em um dos confrontos.
E também a liberdade
dos nascidos em Palmares, além de permissão para realizar comércio.
Em troca, a partir dali, os habitantes do quilombo deveriam
entregar escravos fugitivos que ali buscassem abrigo.
Zumbi – E o fim da Escravidão ?
Ganga Zumba – Não faz parte do acordo.
Dandara - Isso é
inaceitável. Soa como traição
Zumbi – Sim traição
( GRITOS DE TRAIÇÃO SÃO OUVIDOS VÁRIAS VEZES)
Ganga Zumba bebe um líquido e cai morto.
Cena 4
Zumbi – Agora é luta
Dandara – Força e ação
Zumbi – Faremos da disputa
Dandara – E diremos sempre não
Zumbi - A toda forma
de racismo
Dandara – Nosso ambiente prevê igualdade
Zumbi – Força e Fraternidade
Dandara – Mas temos exército palmerino
Zumbi – Firme e ladino
Dandara – Em busca de nossos ideais
Zumbi – Daremos nosso legado
Dandara – Do valor encantado
Zumbi – Da liberdade
Dandara – Aqui todos são iguais
Zumbi – E a igualdade se faz
Dandara – Na repartição das iguarias
Zumbi – Pois sabemos que em um dia
Dandara – A liberdade vai chegar
Cena 5
Um ator entra com várias máscaras e começa a falar:
- não sei qual o rosto de Dandara.
- não sei da vivência real da guerreira
- Sei que sua força não para
- O desejo da alma brasileira
- De dizer não ao racismo
- A Guerreira que disse não à escravidão
- A imagem dela é sua
- Que luta nas praças e nas ruas
- Por liberdade
- Por equidade
- E pela certeza da esperança de viver
- Em liberdade
UM QUILOMBOLA DIZ:
Recebi uma carta e vou chamar de CARTA DE LIBERDADE
É de Dandara,
Tantas Dandaras dizem não ao racismo...
Narração:
TOCA MÚSICA E DANDARA FAZ COREOGRAFIA
Eu pari três filhos pretos e, quando eles ainda não conheciam
direito o mundo, tiveque deixá-los. A minha luta não pesava só no meu ombro. Eu
queria proteger meus meninos. Eu não fiz isso por gosto, mas com a boca
amargando de dor. Eu me fui. Mematei! Preferi a morte à escravidão. Sem pensar
duas vezes, me joguei daquelapedreira direto pro fundo. Eu já estava morta. O
corpo vivia, mas a certeza já estava finada. Arrancaram minha coragem pelos
olhos, entupiram meu nariz com medo, furaram meus olhos de tanta culpa. Eu vivi
coisa que nem o Diabo pinta a sangue. Eu caí no abismo que cavaram para mim e
pra Zumbi, e só me restava o caminho pro fim. Eu precisava parar de respirar
pra salvar um pouco de ar, pra deixar minhas crias vivas. Ou eu me matava, ou
eles matavam meus filhos. A história não explica, só condena. Quem conta não
sente nada, só espreita. Quem ouve nem sempre entende, mas julga. Mulher assim
como eu, que nasceu pra ser gente, não aceita cabresto. Ah, o ódio é um veneno
eterno. Eu morri toda coberta por ele. O meu companheiro foi traído na luta por
um irmão que se dizia aliado, um irmão que tramava em suas costas. O pior dos
açoites é a gente acreditar que pode ser um deles. Quando a traição parececom
você, é como se o espelho o enganasse. Aquilo que não falha estilhaça na sua cara,
e o seu próprio reflexo não é real. Zumbi preferiu se entregar aos inimigos
paraevitar um mal maior. Foi fuzilado, seu corpo foi cortado em partes.
Membros, tronco, cabeça, ele todo espalhado pelo Recife. Mas os meus filhos
Motumbo, Harmódio e Aristogíton, eles viveram. Todos os meus filhos
sobreviveram. No entanto, de suas bocas ninguém nunca ouviu sequer uma palavra.
Pois eles aprenderam cedo que oar, quando é pouco, é só pra respirar. Seguir
vivo é o nosso primeiro ato de luta. Euvivo neles e eles se multiplicaram. Hoje
eu sou mãe de milhões e milhões de filhas e filhos, e meu ventre recebe cada um
de vocês de fora pra dentro. Quero que pousesob meus pés todas as devidas
oferendas que mereço. E cada mão alivia o ódio que me matou. Sim! Eu lutei por
nós. Eu morri pela nossa cor. Sou o espírito livre de Dandara dos Palmares.
In Monocontos: histórias para ler e encenar, p. 147-8)
De: Elisio Lopes Jr.( JUNTO COM A NARRAÇÃO UMA VOZ DOLENTE
NUM CANTO DE DOR)
fim